Comentários ao sistema de prevenção á insolvência disposto no PL 1397/2020

Em trâmite legislativo, o Projeto de Lei apresentado pelo Deputado Federal Hugo Legal tem a finalidade de instituir, em caráter transitório, sistema de prevenção Á insolvência e promover alterações, também provisórias, na Lei n. 11.101/05.

O escopo do projeto é claro: a preservação das atividades econômicas e dos postos de trabalho. Para tanto, cria-se um procedimento de negociação preventiva, até então inexistente na legislação brasileira, e suspendem-se as execuções em curso.

O primeiro capítulo do projeto, que poderá sofrer alterações na sua tramitação, se divide em duas seções, ambas sobre o Sistema de Prevenção Á Insolvência. Do projeto disponível no Congresso Nacional[1], alguns dispositivos chamam atenção.

Inicialmente, o projeto de lei destina-se aos “agentes econômicos”. Isto é, Ás pessoas naturais e jurídicas que exerçam atividades econômicas, independente de registros ou da natureza das atividades.

A intenção legislativa de permitir que todo agente econômico possa se valer dos benefícios do PL mostra-se extremamente abrangente. A imposição de apenas dois requisitos, quais sejam, exercer atividade econômica (de qualquer espécie e independente de inscrição nos órgãos competentes) e redução de no mínimo 30% em seu faturamento, em comparação com o ano anterior, importa em extenso rol de beneficiários.

Pelos requisitos acima delineados, micro e pequenos empreendedores, associações, cooperativas, profissionais liberais, comerciantes irregulares, ambulantes e informais poderão, em tese, se valer da medida.

Entre os principais trechos da proposta original, destaca-se a suspensão das “ações judiciais, de natureza executiva que envolvam discussão ou cumprimento de obrigações vencidas após 20 de março de 2020, bem como ações revisionais de contratos”.

Além disso, ficam vedadas a excussão das garantias reais, fiduciárias, fidejussórias e de coobrigados, assim como a decretação da falência, o despejo, a resolução unilateral do contrato e a cobrança de multas incidentes ao período, nos termos do Projeto de Lei.

Quanto Á suspensão das execuções, percebe-se clara afinidade com os objetivos da Lei de Recuperação Judicial: permitir que o devedor ganhe fôlego e tenha tempo para renegociar suas obrigações, concentrando seus esforços na superação do estado de crise[2].

Ultrapassado o prazo de suspensão automática, o devedor que preencher os requisitos deste PL poderá se valer da intitulada Negociação Preventiva (Seção II – art. 5ºao 8º).

O procedimento de jurisdição voluntária consiste em meio legal de renegociação entre o credor e o devedor. Com efeito, a distribuição do pedido de negociação preventiva acarreta nova suspensão, nos termos do artigo 5ºdeste PL.

No que toca especificamente Á negociação, o devedor deverá observar que: I) poderá se valer do procedimento apenas uma vez; II) poderá requerer a nomeação de negociador especializado (a suas despesas) para conduzir o procedimento; III) deverá apresentar ao juiz relatório com os resultados das negociações promovidas. Ao final, o juiz determinará o arquivamento dos autos.

Contudo, pairam dúvidas quanto Á efetividade do procedimento, uma vez a participação dos credores é facultativa.

Por outro lado, elogia-se a ausência de pena ao devedor que tentar e não obter êxito na renegociação. Sentido contrário importaria em contradição fundamental entre o intuito e o resultado do processo. A cominação de pena, como ocorre, por exemplo, na Lei 11.101/05, em que plano de recuperação judicial que não for aprovado pelos credores importa na convolação em falência da empresa[3], implicaria em verdadeiro desestímulo Á utilização do procedimento – que, lembrando, é voluntário.

Por fim, ressalta-se que a negociação preventiva pode (e deve) ser encarada como um estágio antecedente ao processo de recuperação judicial.

A crise sanitária de dimensões inéditas, além de todos os malefícios que trazem a saúde, acarreta em severa e amarga crise econômico-financeira. Urge, portanto, a necessidade de medidas destinadas a amenizar os irreparáveis danos causados pela pandemia.

[1] https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2242664

[2] TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial.Vol.3. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2017. p. 149-151.

[3] TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial.Vol.3. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2017. p. 424-425.